Cavalleria Rusticana @ S. Carlos, 3 de Novembro de 2010

«A curiosidade matou o gato» Vox populi.

Aconteceu tudo muito ao contrário do que eu previa.
A "ópera contada por uma actriz", que se poderia por alguns julgar interessante, não foi apenas "contar": foi interromper cena a cena como se faz na Flauta Mágica traduzida e narrada para crianças no festival de Óbidos. Não é certamente coisa a fazer na noite de estreia (e restantes récitas) do espectáculo do único teatro de ópera nacional, com um discurso que diz coisas como "o intermezzo [ââh...] é quase uma peça pop do mundo clássico".
Pensava eu, descartando que por aqui diziam "André não é frequentável", que o director artístico ia ser muito bom tal como fora no espectáculo de abertura da temporada. Qual quê! A meu ver, os tempos e as dinâmicas empregues foram desajustados à música. O intermezzo foi estragado.
Outra supresa foi o coro, visto que desta vez, cantaram bem as vozes masculinas, enquanto as femininas estiveram mal. (Curioso foi ver que na primeria actuação do coro houve barulho e dessincronização no levantar, sentar, etc., enquanto na segunda, foi tudo à décima de segundo. Falta de ensaio?)
Ia eu naïfmente pensando que se uma obra-prima destas era em versão de concerto, era porque estavam muito certos da razoabilidade das prestações dos cantores... no entanto,
Sónia Alcobaça cantou monocordicamente o papel de Santuzza, com o seu timbre desinteressante, de linha de constante vibrato sem qualquer forma de expressividade.
Turiddu foi interpretado Fernando del Valle, que é do mais desinteressante que há: empapa o som, não se faz ouvir, tem timbre feio e é rouco. A meio do dueto com Santuzza, deu-lhe para o spinto, enterrando-se mais na sua debilíssima técnica.
Luís Rodrigues fez de Álfio. Não esteve nas suas melhores condições vocais, tendo-lhe escapado a voz a dada altura no Il cavallo scalpita. O resto já se lhe conhece.
Luísa de Freitas assumiu o papel de Lola. Ao contrário da minha ideia inicial, a cantora safou-se, demonstrando que, apesar de ter timbre feio, tem grande capacidade técnica. Não destoou em nada no espectáculo.

Assim a olhómetro, os camarotes, frisas e balcões estavam a uns 30% (com colunas inteiras livres) de lotação, enquanto a plateia comportava uns 60% da sua capacidade. Martin André já se vestiu bem! Por lá estava passeando, se não me falhou o olhar, Jorge Salavisa, sendo que não se contou com a presença da Sr.ª Ministra.

★☆☆☆☆
Para esquecer. Querem acreditar que estou com remorsos de ter estado sempre em cima do pobre e desinteressante alemão?

7 comentários:

  1. Nao concordo nada que aches que o Fernando del Valle era o pior de todos. Eu achei precisamente o contrário. Foi tudo terrivel. Até dava vontade de chorar.

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  2. Mas não notaste logo no princípio como ele estava em cima da música na siciliana e que respirava e que respirava de duas a duas palavras?? Acho que isso diz tudo.

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  3. Caro Plácido,
    Infelizmente estou de acordo com a sua apreciação. Temos pequenas diferenças mas como são variações dentro do bera, nem vale a pena escalpelizá-las. Começa (continua!) muito mal a temporada do São Carlos.
    Se não fosse a Gulbenkian (e que grande excepção é esta!!) seríamos talvez o país da europa com pior qualidade nos espectáculos líricos!

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  4. Blogger e FanaticoUm,
    Olhem só esta: está um cromo no Facebook a agradecer o espectáculo (e parece que também a Antena2 ofereceu bilhetes para ontem), dizendo que «esta ópera em versão de concerto foi uma noite excelente e estão todos de parabéns, que é de louvar esta tentativa de tornar a ópera mais acessível ao público e deixar de ser tão elitista. Venham mais como esta.» Eu acho que a nossa verdadeira elite já fugiu há muito de S. Carlos. (Mais cedo até do que a história da vergonha.)

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  5. ó Placido,

    eu não critico esses agradecimentos sinceros. Possivelmente foi de alguem que nao está familiarizado com o tema. E isso é positivo. Infelizmente não assistiu a uma récita em que nos faz levantar e bater palmas e gritar "brava". Bem, diga-se a verdade que as vezes tenho vontade de o fazer mas tenho vergonha hehe Mas também me pergunto, se a minha vontade de aplaudir é aos cantores ou ao compositor. Sinceramente, as vezes é quem eu mais gostaria de aplaudir.

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  6. Deixem-me entrar também nesta interessante troca de opiniões sobre aplausos.
    Pessoalmente, sinto frequentemente vontade de aplaudir o compositor, mas muitas vezes também os intérpretes (maestro e orquestra incluídos). Um exemplo recente em Lisboa foi o Cosi fan Tutte na Gulbenkian há poucas semanas. Todos mereceram cada um dos muitos aplausos que receberam (na minha opinião).
    Mas algo que me incomoda muito é o início dos aplausos e outras manifestações efusivas de satisfação quando começam ainda antes de os cantores terminarem. Nisto gosto muito mais dos povos anglo-saxónicos do que dos latinos. Mas, quando se gosta, acho que se deve aplaudir efusivamente. Pessoalmente não sou pessoa de gritar "Bravo" ou semelhante, mas aplaudo veementemente quando gosto. E, também gosto de ver o público manifestar desagrado quando as coisas não prestam.

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  7. Esqueçamos então o tema principal (não fui ver, por isso também não tenho nada a dizer) e falemos de aplausos. Eu gosto de aplaudir efusivamente e de pé, até ao fim, assim o espectáculo o justifique. Fico aborrecido quando não me apetece aplaudir ou quando estou desejoso de que a tormenta acabe para sair da sala. Mas enervam-me os aplausos que surgem antes que o silêncio tenha tido tempo para respirar, como um dos caros Fanáticos mencionou há dias. Mas do que gosto mesmo é de uma noite de "bravos" à antiga, daquelas que precisam de uma Gruberova, de um Kraus, de uma Gwyneth Jones, e que não acontecem com os cantorzinhos de voz delicada que há agora por aí.
    Quanto às transmissões do Met na Gulbenkian, tenho pena que o público não se manifeste. Eu aplaudo.

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