Nova Temporada de Música da Fundação Calouste Gulbenkian | 2011/2012

A temporada de música "11/12" da F. C. Gulbenkian foi há pouco dada a conhecer ao público. Quem entrar a partir de hoje na Gulbenkian, pode ver o novo look da "Gulbenkian Música":


A seguir à apresentação do programa, seguiu-se um "momento musical", em que se tocou metricamente um quarteto de Puccini com música da Manon Lescaut, e em que Maria Luísa de Freitas se lançou (em jeito de quem se lança de um precipício) a canções de Luciano Berio.

Numa análise muito superficial do programa, parece que se mantém o standard de qualidade do ano passado, eliminando espectáculos de menor interesse. A qualidade previsível que se pode esperar dos espectáculos varia entre o "atractivo/interessante" e o "muito atractivo/muito interessante". Mas nem um Mahler?!...

A Gulbenkian adianta-se um ano nas comemorações do bicentenário do nascimento de Richard Wagner, com o ciclo "Wagner +". Virão transcrições de Liszt das obras do seu genro, virá o Tannhäuser dirigido por Bertrand de Billy; virão cenas de Tristão e Isolda, e o primeiro e terceiro actos de Siegfried, com a Orquestra Gulbenkian, entre outras peças. E destaque-se a conclusão do ciclo no Anel do Nibelungo, Live in HD From The Metropolitan Opera House, NY (trailer abaixo)..


Há um festival de Jazz em Agosto, deliciosamente quebrado por um recital de Karita Mattila a 17 de Setembro, em que se cantarão canções de Berg, Brahms, Débussy e Strauss.
Mantém-se um ciclo de piano do género dos anteriores, em que participarão Sokolov, Kissin, Maria João Pires, Arcadi Volodos e Radu Lupu, entre outros.
Gustavo Dudamel voltará, desta vez com orquestra sueca. Também Esa-Pekka Salonen voltará (trazendo consigo John Tomlinson) para a sinfonietta de Janacék e a ópera O Castelo do Barba Azul, de Bartók, com narração em português (wtf?!).
Há também um programa interessante com repertório barroco, contando com René Jacobs e Barbara Hannigan -- mas eu, na minha ignorância musical, não tenho paciência para isso, nem para as óperas de Mozart que se passarão.

Entretanto, o programa já está online aqui. O resumo da temporada encontra-se a partir da página 158. Parece uma temporada bastante interessante, mas não "tanto" como dizia por aqui alguém no outro dia.

Die Drei Pintos | Fundação Calouste Gulbenkian (28 de Maio de 2011)

Os Três Pintos é uma ópera cómica esboçada por Carl Maria von Weber no final da sua carreira, e acabada por Gustav Mahler, que não pôde deixar de caprichar romanticamente no entre-acto da obra. A orquestração, na maior parte desta ópera, mantém-se, ainda assim, do género do princípio do século XIX, com algumas nuances mahlerianas.
Programa de sala e libretto.
Narra-se a história de uma espécie de "quadrado" amoroso entre nobres espanhóis. Dois destes fazem-se passar pelo dito Pinto, pelo que aí estão Os Três Pintos em disputa pela donzela Clarissa. O maestro Lawrence Foster, frequentemente olhado de lado, conseguiu sobressair este enredo em música, promovendo a cooperação entre os cantores e a orquestra, optimizando assim as vozes não projectáveis ou menos interessantes.
O auditório da FCG a 3/5.
Quanto aos cantores, apenas dois de oito eram portugueses, e não valeu a pena chamar gente de fora à cena, porque apenas Phillipe Fourcade se evidenciou como Don Pantaleone, o pai de Clarissa (Michaela Kaune). O herói-tenor esteve frequentemente rouco, e algumas notas agudas foram um desastre.
O actor Fernando Luís, que narrou a ópera na perspectiva de Mahler.
Este espectáculo não teve encenação, ao contrário das óperas "semi-encenadas" que na Gulbenkian se têm visto, como Da Casa dos Mortos ou Ariadne auf Naxos: foi uma récita de estante e partitura. David Pountney, que vem no programa de sala indicado como o  responsável pela "concepção", decidiu interromper a ópera e pôr Fernando Luís a narrá-la, impersonando Mahler, que analisava e recompunha os manuscritos de Weber. Foi um aspecto interessante, mas só isso -- interessante.
Sala a cerca de três quintos. Interessante.

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Observação: Coro da Gulbenkian com uma senhora a abanar-se com a própria partitura.

Die Walküre | Met Live in HD

Mais uma vez, do grande auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, assistimos a uma ópera Live (or not) in HD da Metropolitan Opera House. Desta vez, foi A Valquíria, de Richard Wagner. Esta produção do Anel do Nibelungo tem sido muito publicitada por todo o mundo pela sua encenação revolucionária, concebida por Robert Lepage.
Uma das principais imagens publicitárias desta nova produção.
A encenação é extraordinária, embora, como já tenho ouvido dizer, a cena final não tenha nem metade da potência da produção de Schenk, por muitos considerada "uma doença". Uma descrição pormenorizada pode ser lida no blog "Fanáticos da Ópera".
Siegmund, na tempestado do princípio do acto I.
Siegmund e Sieglinde foram, respectivamente, interpretados por Jonas Kaufmann e Eva-Maria Westbroek. Que duo! Kaufmann tem sido muito criticado "por não ser um verdadeiro heldentenor", mas penso que isso (sim) é uma crítica verdadeiramente destrutiva; com o seu timbre "escuro", Kaufmann consegue dar grande credibilidade a Siegmund. Sieglinde foi simplesmente fantástica!
Sieglinde regressa para junto de Siegmund.
Bryn Terfel, que ultimamente tem tido queda para wagneriano, foi um excelente Wotan. Também aqui as opiniões têm divergido, e até compreendo o sentido daqueles que dizem que wagner não é his cup of tea. A voz, por vezes, parece pouco cheia para o deus, mas a sua expressividade, quer vocal quer cénica, ultrapassa em larga medida esse possível defeito.
Sieglinde indica a espada Notung.
Como se escreveu no Opera Obsession, "quando é que alguma vez se quis que o dueto de Fricka com Wotan durasse tanto"? A isso, devemos a excelente prestação vocal de Stephanie Blythe. Na na FCG, sentia-se aquela maravilhosa voz a encher a sala -- e a cabeça de Wotan!
O fim do diálogo de Wotan com Fricka.
Hans-Peter König, barítono de inquestionáveis qualidades vocais, deixou-me um pouco desapontado com o seu Hunding. Faltou-lhe objectividade no modo como expunha os seus sentimentos. Por exemplo, quando dizia que Siegmund não lhe era bem-vindo por este não ser protegido pelas nornas, mais parecia que estava a contar uma piada, e penso que não é essa intenção.
Wotan conta a Brünnhilde a história do Ouro do Reno.
Mas a alma do espectáculo, a Valquíria de Deborah Voigt, é que pode ter sido uma quebra na qualidade do espectáculo -- temos uma cantora principal fora de repertório. Por mais que tente mudar o ponto de vista, desde que começam aqueles Hojotohos, nota-se esse defeito. É uma Brünnhilde pouco modesta e demasiado travessa, que não me conseguiu convencer.
Ao morrer, Siegmund reconhece o seu pai, Wälse.
Devo deixar uma nota muito positiva dirigida às oito outras Valquírias, que estiveram perfeitamene sincronizadas, sem gritos e com vozes bonitas. HojoTToho para elas!
A brilhante encenação para a cavalgada das valquírias, merecidamente aplaudida!
A direcção musical do grande Levine vai cada vez mais rápida, e já começo a compreendê-la, mas, à medida que algumas partes da música atingem pontos de calar as tosses, sinto que o amor -- já em si com uma orquestração, digamos, wagneriana -- vai-se perdendo. Já assim falava Carlo Maria Giulini...
A encenação do épico finale, embora interessante, não tem nem metade da potência da encenação de Schenk.

Encerra-se com chave de ouro a temporada de 2010-2011 do Met Live in HD. Veja aqui o que virá na próxima.




Excelente espectáculo; auditório quase cheio.

Il Cappello di Paglia di Firenze | Teatro Nacional de São Carlos (Crítica)

Figurantes que "iniciam" os actos.

O Chapéu de Palha de Itália é uma ópera de Nino Rota, compositor do soundtrack da grande trilogia de filmes O Padrinho. É uma ópera muito leve, de carácter quase rossiniano. Eis a minha sinopse:
É o dia do casamento de Fadinard (Mário João Alves) com Elena (Lara Martins). Fadinard conta que, na chegada a Paris, o seu cavalo comeu um chapéu de palha de Florença que pertencia a Anaide (Dora Rodrigues). De repente, em sua casa, entra Anaide acompanhada por um militar (João Merino), que lhe exige um chapéu igual, porque nessa mesma noite Anaide (sua amante) terá de regressar a casa e mostrar o chapéu ao marido ciumento. Enquanto não tiverem o chapéu, o militar e Anaide fechar-se-ão em casa de Fadinard, sob a ameaça iminente de um duelo.
Fadinard procura o chapéu numa modista (Ana Franco), que lhe indica que quem lhe comprou um igual foi a baronesa de Champigny (Maria Luisa de Freitas); e o herói vai atrás dela. Chegando a sua casa, é confundido com um violinista virtuoso, tirando disso proveito para concluir que o chapéu foi oferecido a Mme. de Beaupertuis.
Fadinard chega então a casa de Beaupertuis e conta ao dono (Luís Rodrigues) a sua história: depressa este identifica a sua esposa como Anaide e ambos seguem para casa de Fadinard.
No meio de peripécias e confusões buffas, um chapéu igual surge como prenda de casamento a Elena, sendo entregue a Anaide (e acidentalmente estragado logo a seguir). Beauperuis fica convencido de que tudo está bem no seu casamento e a boda de Fadinard e Elena prossegue ditosa.
Os cantores portugueses, mais ou menos como especulei no último post, foram bem escolhidos. Deles, destaco José Fardilha como Nonacourt, que teve uma óptima prestação. Diga-se de passagem que os outros solistas cumpriram e criaram um bom ambiente musical.
A direcção musical de João Paulo Santos pareceu-me interessante na música de Rota, que pouco génio ou ambiguidade revela. Mas tenho a certeza de que o maestro, a dado momento, estava "atrás" da música.
A encenação, do ponto de vista da cenografia e dos figurinos, esteve interessante, colorida, dinâmica e vivaz, condizendo economicamente com esta ópera. Todavia, a movimentação dos actores em palco nem sempre foi bem concebida, parecendo até forçada e, em alguns casos, pouco corroborada pelas capacidades expressivas dos cantores.

★★★☆☆ (3/5)

Fotografias:

Cena do casamento.

As trabalhadoras da modista.

O ciumento Beaupertuis imaginando onde tarda a sua esposa a chegar.

O célebre!!!
Imagens da páginal oficial do TNSC no Facebook e do programa de sala.

Il Cappello di Paglia di Firenze (O Chapéu de Palha de Itália) | Teatro Nacional de São Carlos

 Está à procura da crítica? Carregue aqui para seguir para esse post.

O Chapéu de Palha de Itália (ou de Florença?) é uma ópera em quatro actos que narra uma história algo buffa -- se bem que posta em música por um compositor de soundtracks de filmes dos anos 1950' -- acerca, como o nome indica, de um chapéu.

Imagens de http://www.facebook.com/SaoCarlos.
No regresso do seu casamento, o cavalo de Fadinard come o chapéu de Anaide, que exige um igual, sob a ameaça de desafio para um duelo que o seu amante faz a Fadinard; o protagonista procura, acabando por ir parar à casa da própria Anaide, sem o chapéu; por sorte, aparece o tio de Fadinard, que lhe oferece um chapéu igual ao outro. Ficam todos felizes e a ópera acaba.


Claro que isto é demasiado pesado para o Plácido Zacarias, e ele preferiu ficar no sofá a ouvir o broadcast d'A Valquíria da Metropolitan Opera House. Não obstante, o S. Carlos já divulgou um filme com excertos do espectáculo -- e eu, em tempos de troika, não vou gastar dinherio com encenações que misturam os vestuários dos séculos XVIII e XX. Fico à espera de comentários de leitores que tenham ido ver, porque os cantores portugueses parecem ter sido bem escolhidos.

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Il Trovatore | Met Live in HD

Assistimos ontem, Live from The Metropolitan Opera House, a um bom espectáculo.

Um dos cartazes publicitários, com Hvorostovsky. O baixo-barítono esteve fenomenal como conde de Luna -- nada mais a dizer.
Com uma encenação bem concebida, McVicar concebeu uma plataforma rotativa em parte do palco, permitindo a troca de cenários, assentes em dois espaços-base. A acção foi transportada para o século XVIII -- o que foi, provavelmente, menos interessante.

O cenário com as bigornas, para o célebre coro.
O herói Manrico (o trovador) foi interpretado por Marcelo Álvarez, que esteve à altura do papel pedido. É um tenor já conhecido e de carreira mais ou menos estabelecida. Um dos tags que eu lhe daria, logo à partida, era o de rouco, mas passou muito bem, com uma técnica consistente. Quando chegou aos dós agudos (?) em "all'armi", nem acreditei no que estava a ouvir: som claro, seguro, e bem prolongado. Bravo!

Radvanovsky e Hvorostovsky.
Sondra Radvanovsky, por sua vez, tomou o papel de Leonora. Fiquei com a impressão, como dizem os Fanáticos da Ópera, de que a sua voz "era capaz de encher três Mets", perdendo a beleza do timbre. Não nego que tenha uma voz bonita, mas nego que tenha boa técnica e boa dicção -- não se percebe nada do que canta. Por vezes, nota-se que há alguma falta de controlo sobre as inspirações. Mas, dicção fora, arrasou na ária "d'amor sull'ali rosee". Nada mal.

Radvanovsky como Leonora.
O difícil papel da cigana Azucena foi interpretado pela meio-soprano Dolora Zajik. Parece que não sou o único a reparar que esta é a Azucena do Pavarotti no Met; mais de vinte anos depois, é óbvio que já não iguala a arrasadora qualidade que teve outrora, mas permanece uma óptima intérprete, com credibilidade cénica crescente!

  
Álvarez com Radvanovsky, no finale.
A direcção de Marco Armiliato, em substituição do grande Levine, indicia, cada vez mais, uma nova era para o Met: a era de Armiliato, principal conductor. E se for como ontem, não parecem haver motivos para grandes reclamações.