Carmen | Teatro Nacional de São Carlos

E eis que se conclui a temporada 2010-2011 do Teatro Nacional de São Carlos. Esta temporada foi por muitos considerada um grande "barrete" e, como tal, muitos amantes de ópera não puseram os pés em S. Carlos nos últimos seis meses -- o que é natural. Exceptuando a Katìa Kabanová e esta mesma Carmen, penso que nenhuma das óperas foi um espectáculo de qualidade não-duvidosa. O Chapéu de Palha de Itália foi interessante, mas não pertence ao grande repertório, atraindo pouco público. Claro que, com a Carmen, a sala esteve e estará cheia e esgotada para todas as récitas.
Uma Carmen (Shaham) muito sensual... (Fot. da reportagem do "Bom Dia Portugal")
Pela primeira vez na temporada, a encenação atingiu um nível solidamente bom. Transporta-se a acção para meados da primeira parte do século XX de uma forma pertinente e consistente, incorporando factores muito originais. Há ainda que notar, como aspecto negativo, o facto de a encenação não dar centralidade à conspícua e sensual Carmen, magistralmente interpretada por Rinat Shaham. Esta cantora, possuindo um timbre de mezzo adequado ao papel -- que tem interpretado pelo mundo fora --, e usando uma óptima capacidade cénica, teve um excelente desempenho, conseguindo mobilizar inteiramente a pequena sala de S. Carlos. Foi a estrela da récita!
...a atirar-se a um Don José que não a soube merecer...
O ardente- e eternamente apaixonado Don José foi interpretado pelo tenor Andrew Richards. Já o tinha ido ver no YT (via Verona), e tinha-me parecido um bom intérprete na romanza da flor, mas tal não se verificou ao vivo. Pelo contrário, a sua banalidade no canto -- se bem que de timbre bonito -- e nos recitativos reflectem, aos meus olhos, os ares que o tenor se faz dar no seu blog público chamado "Opera Rocks".
Yannis Yanissis não foi um toreador fascinante nem mediático (que era o que a encenação fazia dele). Nem sempre se fez ouvir, e foi algo "monocórdico" e pouco expressivo. A Micaëla de Adriana Damato foi algo estridente e pouco comedida, não tendo conseguido criar a atmosfera de "ária" no penúltimo acto.
...e um coro muito bem disciplinado!
Os coros -- tanto o dos adultos como o das crianças -- tiveram um óptimo desempenho, e, observando o olhar da maestrina Julia Jones, dir-se-ia que foram a sua principal atenção. Já não é a primeira vez que a maestrina inglesa deixa a orquestra algo negligenciada para pôr o coro do TNSC a cantar bem. Há que saber quando se deve parar.

Quatro estrelas seriam de ponderar, por Shaham e pela encenação.

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Estúdio de Ópera em S. Carlos: A Geração de Setenta (Foyer Aberto)

Decorreu ontem, no foyer de S. Carlos, mais um concerto no âmbito do "Estúdio de Ópera", dirigido pelo pianista-martelador João Paulo Santos. Embora já da outra vez tenha alertado neste blog para o grande interesse do concerto, até houve menos público do que na outra vez. E desta vez foi mesmo uma pena, porque penso que se possa ter feito uma descoberta de nível nacional!

Segundo a apresentação de João Paulo Santos, na geração da década de setenta, os líderes intelectuais portugueses consideravam o repertório italiano demodé; buscavam a crítica social e a revolução, que encontravam na ópera francesa. Assim, cantaram obras de Gounod, Meyerbeer, Offenbach, dois números de Donizetti, e compositores portugueses (sempre atrasados no tempo): Keil e Augusto Machado. O raciocínio desta programação foi interessantíssimo!

Não se esqueçam!
A soprano Carmen Matos tratou a partitura como um espartilho e fê-lo ao seu próprio risco. Esteve rouca na primeira canção, começou abaixo da tonalidade numa outra, e não deslumbrou nem por perícia vocal, por beleza tímbrica, nem por actuação.

Gostei da interpretação de Bruno Pereira (barítono). Não se trata de um cantor de extraordinários recursos vocais. Muitos dos aplausos que lhe foram dirigidos (sobretudo após uma ária do Fausto) reflectiram essencialmente a sua expressão física apropriada a Mefistófeles, e ao público, que ficou eufórico desde a actuação do tenor Bruno Almeida. E quanto a este último: será ele uma revelação em fase de amadurecimento vocal? Será que há potencial internacional? Será que eu me esqueci de lavar os ouvidos? Talvez. Este cantor não cai em nenhum dos erros frequentes: não canta fora do repertório, não usa mal o vibrato, não se excede nas dinâmicas. Dá-me ideia de que anda a seguir as passadas do Grande Plácido. O timbre (mais banal, claro está) faz lembrar ligeiramente o daquele tenor, bem como a sua postura física. Parece antitético, mas imagino-o a cantar o Baile de Máscaras. Há alguma falta de transparência nas notas mais agudas, mas isso pode fazer parte do tal "processo de maturação". Mas sente-se cada nota que ele canta. Desde que cantou a ária final de Edgardo da Lucia, o público ficou eufórico, e penso que os outros cantores se aproveitaram disso. Bravo!

Com certeza, os leitores notaram que consegui escrever aqui um comentário com mais palavras do que critico uma ópera inteira. Isso é para vos chamar a atenção de que ainda há, na próxima quarta-feira, mais um concerto destes!! 2 em 1: concerto e palestra gratuitos!

Porque hoje é dia de Portugal...

... desafio os leitores deste blog a fazerem algo tão simples como levantarem-se, irem buscar a família, e ouvirem em conjunto uma magnífica composição de Alfredo Keil: o Hino Nacional Português.


A isto, Portugueses, chamo eu exaltação do orgulho nacional, e penso que, a longo prazo, será dos mais importantes factores a nível psicológico que levarão os Portugueses a querer sair da crise.

As armas de Portugal numa encenação de Don Carlo, de Verdi. (Fot. Koichi Miura/Met Opera - do tour da Metropolitan Opera no Japão, Junho 2011)

Beethoven 9 | Fundação Calouste Gulbenkian, 3 de Junho de 2011

Em primeiro lugar, gostava de dizer que já houve um espectáculo semelhante a este, na Gulbenkian, há cerca de dois anos.
Na primeira parte, tocou-se a abertura de Fidelio e cantou-se Ah! Perfido!. A soprano Adina Aaron demonstrou ter uma voz com óptima projecção, mas de timbre pouco interessante, e com uma iminente ameaça de estridência.

O maestro Bertrand de Billy.
Depois do intervalo, foi a nona sinfonia. Acabando em Hino Europeu, é uma forma de encerrar com chave de ouro -- neste caso, leia-se de prata -- qualquer ciclo de concertos de música clássica. A direcção musical de Bertrand de Billy é interessante; básica (por vezes demasiado) em alguns aspectos, e pouco convencional noutros. O coro da Gulbenkian teve um bom desempenho vocal, passando também por uma atitude física algo desmazelada e por alguns "picos" de estridência. Os quatro solistas possuíam capacidades vocais heterogéneas. Nenhum tinha uma voz particularmente bonita. O barítono projectava bem a voz, o tenor tinha algumas dificuldades "técnicas", a meio-soprano não se fazia ouvir, e a soprano da primeira parte teve um bom desempenho.
Foi um espectáculo interessante, aplaudido efusivamente e de pé.

Um espectáculo bonzito. Os bilhetes estavam esgotados, mas houve muitos lugares vagos.

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